AVC: reconhecer sinais e agir com rapidez são as chaves para salvar vidas | Veja Saúde
Reforçar a necessidade de buscar ajuda médica imediatamente, no lugar certo e com profissionais adequados, diante de uma suspeita de acidente vascular cerebral (AVC) é um dos propósitos do Dia Mundial do AVC, instituído em 29 de outubro de 2006 pela Organização Mundial do AVC (WSO, na sigla em inglês). Este ano, a campanha promove a expressão #PreciousTime (tempo precioso, em tradução livre) para lembrar que o tempo é elemento crucial quando se trata de evitar sequelas e óbitos. “A cada cinco minutos uma pessoa morre no Brasil em decorrência de AVC, o que mostra a gravidade e a prevalência da doença”,1 atesta o dr. Daniel Abud, neurorradiologista intervencionista do Hospital Nove de Julho, em São Paulo, que faz parte da Dasa, maior rede de saúde integrada do Brasil.
A urgência no atendimento aos casos de AVC se explica: o entupimento ou rompimento de um vaso que leva sangue ao cérebro afeta a “alimentação” dos neurônios. A cada minuto sem oxigênio, quase 2 milhões dessas células do sistema nervoso são afetadas.2 “Os neurônios deixam de funcionar, causando déficits neurológicos que variam dependendo da localização do problema no cérebro”, explica o dr. Daniel Abud.
O dr. Marcus Tulius, neurologista do Complexo Hospitalar de Niterói (CHN), referência em atendimento de neurologia da Dasa no Rio de Janeiro, faz uma analogia: “Quando há uma oclusão, imagine como se fosse uma pedra jogada no lago. Ela forma ondas que vão se afastando. O ponto onde a pedra caiu é o centro da lesão isquêmica, que sofre uma necrose. Todo o entorno é uma zona de tecido cerebral que está sofrendo. Por essa razão é preciso atuar para conter a propagação e evitar danos adicionais”.
É fundamental, portanto, procurar sem demora o pronto atendimento, de preferência via serviço de ambulância, ao perceber alguma manifestação neurológica. “Os sintomas do AVC aparecem de uma hora para outra. Por isso, é muito importante aprender a reconhecê-los”, lembra a dra. Letícia Rebello, neurologista do Hospital Brasília, que faz parte da Dasa, no Distrito Federal. “Portanto, esteja atento aos sinais de alerta: boca torta ao sorrir, dificuldade de falar ou entender o que se fala e perda de força ou sensibilidade em um dos lados do corpo. Nossa máxima para esse problema é correr contra o tempo para evitar danos cerebrais maiores”, explica a médica, que é head de neurologia da Dasa e responsável pelo apoio na implementação do protocolo de AVC em todos os hospitais da companhia.
Segundo o dr. Marcus Tulius, saber exatamente para onde ir quando surge a suspeita do problema é o ponto-chave para aumentar as chances de desfechos positivos. O CHN, por exemplo, é um dos hospitais mais citados no aplicativo AVC Brasil, que relaciona as instituições com aparato e profissionais capacitados a lidar com essa emergência. Lançado em 2016 pela Rede Brasil AVC e oferecido de forma gratuita nos sistemas Android e iOS, o app também reúne informações importantes sobre a doença. “Ainda hoje grande parte das sequelas acontece porque a pessoa chega tardiamente ou, infelizmente, não recebe o tratamento adequado”, aponta o dr. Marcus Tulius.
Entre as consequências mais frequentes dos episódios, o médico destaca, em primeiro lugar, o desenvolvimento de demência vascular, que afeta as funções executivas e, portanto, a qualidade de vida, a independência e o convívio social:5 “O comprometimento motor é outro desafio, prejudicando a capacidade de realizar as atividades diárias. E os transtornos de linguagem, como a afasia, que atrapalham a comunicação e são de difícil resolução, principalmente para os mais idosos”, completa.
Precisão na abordagem já na chegada
O AVC está dividido em dois grandes grupos. “Quando a circulação que leva o sangue ao cérebro é interrompida por um coágulo, estamos falando do tipo isquêmico”, explica o dr. Daniel Abud, do Hospital Nove de Julho. Nos casos em que o sangue extravasa das artérias, trata-se de um AVC hemorrágico. “Ambos são extremamente graves, tanto por causar incapacidade funcional quanto por óbito. O isquêmico, porém, é o mais frequente. Representa em torno de 80% dos casos no Brasil”,3 destaca.
A diferenciação entre os dois tipos para propiciar o atendimento adequado depende de exames de neuroimagem, cujos resultados devem ser interpretados por um especialista. “A triagem precisa ser feita de forma prioritária, assim como todo o fluxo de atendimento na emergência, para que o paciente comece a receber o tratamento o mais rápido e da forma mais adequada possível”,4 diz a dra. Letícia Rebello.
“Desde meados da década de 1990, ficou comprovada a eficácia do tratamento de AVC isquêmico, chamado de trombólise endovenosa. Injetado na veia, o medicamento tem a capacidade de dissolver o coágulo, fazendo o sangue voltar a circular no cérebro. A partir daí, o mundo começou a criar estruturas hospitalares e protocolos para o manejo correto do problema”, conta o dr. Daniel Abud.
Para os casos em que se ultrapassa a janela adequada de tempo para o uso dessa medicação, é possível recorrer à trombectomia mecânica, desde que alguns critérios de inclusão sejam preenchidos. “O procedimento é feito por um cateter inserido pela virilha que vai até o ponto da obstrução para remover o trombo”, explica o dr. Marcus Tulius, do CHN, que conta com salas específicas para tratar a fase aguda do AVC por meio da trombectomia. “Estar em um hospital com tecnologia e profissionais preparados para oferecer tratamento de ponta faz toda a diferença para a sobrevida e a qualidade de vida dos pacientes”, diz.
O acompanhamento no pós-alta é outra premissa importante. “A primeira preocupação é evitar a recorrência do AVC, sobretudo nos primeiros 90 dias. O paciente precisa ser instruído a adotar bons hábitos, que incluem não fumar, assim como controlar diabetes e colesterol. Além disso, deve ser orientado a tomar antiagregante plaquetário, como ácido acetilsalicílico, popularmente conhecido como AAS, para prevenir a formação de novos trombos”,4 enumera o dr. Marcus Tulius.
De acordo com a dra. Letícia Rebello, o programa de reabilitação deve começar assim que possível, com fisiatra, fisioterapeuta, fonoaudiólogo, terapia ocupacional e demais profissionais exigidos pelo quadro. Outro problema que ocorre com frequência – e que muitas vezes não recebe a devida atenção – é a ocorrência de depressão pós-AVC. Nesses casos é importante a avaliação de psiquiatra e psicólogo.6 A depender, pode-se identificar uma alteração cardíaca como causa do AVC, quando também é preciso envolvimento de cardiologista no plano terapêutico.
Para evitar que aconteça
“O AVC isquêmico tem duas causas principais, e uma delas são as arritmias cardíacas”, observa o dr. Daniel Abud. Essas irregularidades no ritmo do coração acabam resultando em coágulos que podem se soltar e seguir pela corrente sanguínea até o cérebro.7 “Outro fator é a doença aterosclerótica, ou seja, a formação de placas de gordura nas artérias, tanto do pescoço quanto do cérebro”,8 diz o especialista. “Para prevenir essas condições, é importante adotar hábitos alimentares saudáveis, a prática regular de exercícios físicos, assim como controlar colesterol, glicemia e pressão arterial”, resume. E como o avançar da idade é um aspecto a ser considerado, o médico lembra a necessidade de fazer check-ups periódicos a partir dos 40 anos, com a realização de exames sanguíneos e de imagem para analisar a progressão desses fatores de risco que se tornam mais recorrentes com o envelhecimento.
Referências:
- https://redebrasilavc.org.br/avc-matou-mais-de-100-mil-pessoas-em-2021/
- https://jornal.usp.br/radio-usp/dia-mundial-de-combate-ao-avc-tem-foco-no-reconhecimento-rapido-dos-sintomas/
- https://bvsms.saude.gov.br/avc-acidente-vascular-cerebral/
- https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/manual_rotinas_para_atencao_avc.pdf
- https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/diretrizes_atencao_reabilitacao_acidente_vascular_cerebral.pdf
- https://n.neurology.org/content/98/10/e1021.full
- https://jornal.usp.br/atualidades/arritmias-cardiacas-podem-ser-caminho-para-o-avc/
- https://www.gov.br/saude/pt-br/assuntos/saude-de-a-a-z/a/avc